Escrever o romance "Tentação da Serpente" (nova edição de "O Romance da Bíblia", cujo título não correspondia correctamente ao conteúdo do livro, que apenas retrata as histórias e ambientes do Antigo Testamento) foi o meu protesto e denúncia dos crimes a que ainda hoje estão sujeitas as mulheres em muitas partes do mundo muçulmano, onde impera a lei da Sharia e o fanatismo religioso.
Quando o poder é exercido pelos fundamentalistas islâmicos, a mulher, em qualquer estado civil da sua vida não goza de quaisquer direitos fundamentais, nem da protecção do Estado contra os que a violentam física e psicologicamente, a humilham ou assassinam.
As três grandes religiões - cristianismo,judaísmo e islamismo - reclamam-se como únicas e verdadeiras, sendo todavia herdeiras do mesmo Livro Sagrado, escrito a partir das lendas e mitos da tradição oral de povos nómadas, em tempos de violência e ignorância, em que a mulher tinha um estatuto e valor semelhante, senão inferior, aos do gado. No cristianismo a evolução foi custosa mas triunfante, mais lenta no judaísmo e de retorno à mais primitiva barbárie no muçulmano.
No meu romance, procurei recriar esse mundo do Antigo Testamento, segundo uma perspectiva realista e histórica, com base nos textos bíblicos, mas também em documentos e vestígios de outros povos seus vizinhos. E esse mundo brutal, de selvagem luta pela sobrevivência de um povo supostamente "escolhido", surge através do sacrifício e humilhação de todas aquelas mulheres que são apresentadas como exemplo de sujeição obediente ou de pecado merecedor de castigo e até de morte, à mercê da arbitrariedade e capricho dos homens, que justificam todos os seus crimes e violência sexual contra as mulheres "com a vontade de Deus, de Jeová ou de Alá"!
Tema, portanto, de extrema actualidade, quando a tão aclamada "Primavera Árabe", em poucos meses se transformou no mais negro e infernal Inverno.