Blogue da escritora Deana Barroqueiro sobre o desrespeito dos direitos humanos e a violência contra mulheres e crianças.
Romance: Tentação da Serpente
Um olhar feminino sobre o Antigo Testamento.
Uma história de mulheres, para mulheres, de que os homens também gostam.
"Tentação da Serpente" é uma reedição de "O Romance da Bíblia", publicado em 2010.
15 julho 2013
A impossível primavera árabe
Homem é preso após mostrar um vídeo de jovens a serem lançados de uma torre num prédio no Egipto
Um homem foi preso no Egito neste domingo (7) após a divulgação de um vídeo que mostra pessoas lançando dois jovens de uma torre no terraço de um prédio.
O vídeo mostra o imóvel nos arredores do local onde houve um confronto na sexta-feira (5) entre simpatizantes e opositores do ex-presidente Mohamed Morsi, disse o Ministério do Interior egípcio.
O vídeo amador, cuja descrição diz ter sido filmado no bairro de Sidi Gaber, em Alexandria (norte do Egito), foi colocado na internet e rapidamente se espalhou pelas redes sociais, provocando comoção e controvérsia no país.
Simpatizantes e opositores rejeitam a responsabilidade pelo acto violento.
As imagens mostram quatro jovens escondidos em uma torre no terraço de um prédio baixo. Em seguida, muitos homens sobem ao terraço, entre eles um que traz uma bandeira com um emblema usado por jihadistas. Por várias vezes, pedras são lançadas contra os jovens que estavam na torre, enquanto se ouve o som de tiros.
Um homem chega ao alto da torre e empurra um dos jovens, que cai de uma grande altura. Homens armados com bastões e pedaços de madeira batem espancam o corpo da vítima. Em seguida, um segundo jovem é atirado do mesmo local.
O acto de violência deixou um homem morto, segundo fontes de segurança.
13 julho 2013
Malala Yousufzai faz emocionante discurso na ONU
11 maio 2013
Autoridades nigerianas libertam 17 raparigas de uma «fábrica de bebés»
As autoridades nigerianas encontraram 17 adolescentes grávidas numa casa e estão à procura de uma mulher suspeita de planear vender os bebés, anunciou esta sexta-feira uma fonte oficial.
Segundo os residentes, a casa designada por ‘Ahamefula Motherless Babies Home’ era um orfanato e um abrigo para futuras mães."De acordo com uma pista, uma unidade especial do comando da polícia do estado de Imo invadiu a casa ilegal em Umuaka, na quarta-feira, e resgatou 17 raparigas, com idades entre 14 e 17 anos, em diferentes estágios da gravidez," disse à AFP Joy Elomoko, agente da polícia do estado de Imo.
“As raparigas afirmaram que eram alimentadas uma vez por dia e estavam proibidas de sair de casa”, acrescentou.
Posteriormente, as adolescentes revelaram às autoridades que estavam grávidas de um homem de 23 anos, que agora está sob custódia, juntamente com o guarda de segurança que vigiava a casa.
"A proprietária da casa continua desaparecida, mas já alertámos todas as unidades", disse a agente da polícia.
Segundo um relatório divulgado em Abril, a União Europeia identificou a Nigéria como o país africano onde este problema mais se verifica.
No relatório, é referido que a venda de crianças aumentou e as autoridades nigerianas já encontraram outras “fábricas de bebés”.
Em maio de 2011, na região sudoeste do estado de Abia, as autoridades libertaram 32 mulheres grávidas que afirmaram que tinham sido pagas para vender os seus bebés por valores entre 25 mil e 30 mil naira (191 dólares - euro), dependendo do sexo do bebé.
Um outro grupo de 17 raparigas foi encontrado, em Outubro de 2011, no sul do estado de Anambra, em circunstâncias semelhantes.
A UNESCO classificou o tráfico humano como o terceiro crime mais praticado na Nigéria, depois da fraude e tráfico de droga.
Diário Digital com Lusa
23 abril 2013
Oferta de romance no Dia Mundial do Livro
Gostaria de commemorar convosco este Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor, oferecendo-vos um romance. Na impossibilidade de o fazer a todos, terei de me limitar a uma das minhas obras.
Só terão de escrever um comentário com o nome da obra que gostariam dereceber e a razão da preferência.
O livro será dado ao leitor que melhor justificar a sua escolha.
Podem responder também no Facebook, se tiverem dificuldades em o fazer aqui.
Os que não conhecem a minha obra, consultem as sinopses das obras na minha Página Principal.
O prazo para as respostas termina à meia-noite de 24 de Abril.
O vencedor será anunciado no dia 25 de Abril.
Boa sorte!
28 fevereiro 2013
"Tentação da Serpente" - o meu protesto e denúncia
Escrever o romance "Tentação da Serpente" (nova edição de "O Romance da Bíblia", cujo título não correspondia correctamente ao conteúdo do livro, que apenas retrata as histórias e ambientes do Antigo Testamento) foi o meu protesto e denúncia dos crimes a que ainda hoje estão sujeitas as mulheres em muitas partes do mundo muçulmano, onde impera a lei da Sharia e o fanatismo religioso.
Quando o poder é exercido pelos fundamentalistas islâmicos, a mulher, em qualquer estado civil da sua vida não goza de quaisquer direitos fundamentais, nem da protecção do Estado contra os que a violentam física e psicologicamente, a humilham ou assassinam.
As três grandes religiões - cristianismo,judaísmo e islamismo - reclamam-se como únicas e verdadeiras, sendo todavia herdeiras do mesmo Livro Sagrado, escrito a partir das lendas e mitos da tradição oral de povos nómadas, em tempos de violência e ignorância, em que a mulher tinha um estatuto e valor semelhante, senão inferior, aos do gado. No cristianismo a evolução foi custosa mas triunfante, mais lenta no judaísmo e de retorno à mais primitiva barbárie no muçulmano.
No meu romance, procurei recriar esse mundo do Antigo Testamento, segundo uma perspectiva realista e histórica, com base nos textos bíblicos, mas também em documentos e vestígios de outros povos seus vizinhos. E esse mundo brutal, de selvagem luta pela sobrevivência de um povo supostamente "escolhido", surge através do sacrifício e humilhação de todas aquelas mulheres que são apresentadas como exemplo de sujeição obediente ou de pecado merecedor de castigo e até de morte, à mercê da arbitrariedade e capricho dos homens, que justificam todos os seus crimes e violência sexual contra as mulheres "com a vontade de Deus, de Jeová ou de Alá"!
Tema, portanto, de extrema actualidade, quando a tão aclamada "Primavera Árabe", em poucos meses se transformou no mais negro e infernal Inverno.
Menina violada condenada a cem chicotadas
Folha de S. Paulo
Quarta-feira 27 de Fevereiro de 2013
"Uma jovem de 15 anos vítima de estupro foi condenada a receber cem chibatadas por manter relações sexuais sem ser casada, de acordo com autoridades das Maldivas.
As acusações contra a garota foram feitas no ano passado depois que a polícia investigou denúncias de que o padrasto a teria estuprado e matado o filho dos dois. Ele ainda será julgado.
Promotores, no entanto, dizem que a condenação da garota não tem relação com o caso de estupro. A Anistia Internacional disse que a sentença é "cruel, degradante e desumana". O governo das Maldivas disse que não concorda com a punição e que tentará mudar a lei.
A porta-voz do tribunal de menores, Zaima Nasheed, disse que a jovem também deverá permanecer em um reformatório por oito meses. Ela defendeu a condenação, dizendo que a menina cometeu voluntariamente um ato ilegal.
Autoridades locais afirmam que ela será punida quando completar 18 anos, a não ser que peça o adiantamento da punição.
O caso nos tribunais teve início depois que a polícia foi chamada para investigar o corpo de um bebê morto, que foi encontrado enterrado na ilha de Feydhoo no Atol de Shaviyani, norte do país. O padrasto da garota foi acusado de estuprá-la, engravidá-la e de matar o bebê. A mãe também é acusada de não denunciar o abuso às autoridades.
O sistema judiciário das Maldivas, um arquipélago islâmico com uma população de cerca de 400 mil pessoas, tem elementos da sharia (lei islâmica) e do direito britânico.
O pesquisador da Amnistia Internacional Ahmed Faiz disse que o açoite é "cruel, degradante e desumano" e pediu que as autoridades abandonem a prática. "Estamos muito surpresos que o governo não esteja fazendo nada para anular esse tipo de punição - removê-lo totalmente da legislação." "Esse não é o único caso. Está acontecendo frequentemente - no mês passado houve outra garota que foi violentada e condenada a chibatadas", afirmou.
Faiz disse ainda que não sabe quando a sentença do caso anterior foi executada, já que as pessoas não querem discutir abertamente a situação.".
(Nota: O texto, extraído do Jornal Folha de S. Paulo, está escrito em Português do Brasil)
15 fevereiro 2013
Malalai Joya - The Film

A Woman Among Warlords - Malalai Joya - The Film
Malalai Joya in Facebook: https://www.facebook.com/awomanamongwarlords
13 janeiro 2013
Mais de 800 casos de violência doméstica num mês e meio
Até à entrada em vigor do novo instrumento de avaliação do risco, as polícias vão continuar a utilizar o modelo que está em funcionamento desde 2007, embora, na opinião de Luís Isidro, seja "muito mais longo, descritivo, narrativo".
29 dezembro 2012
Índia: abertura de inquérito especial a violação coletiva em Nova Deli
A barbárie nos países em que as mulheres não têm direitos nem protecção legal.
As Victim of Gang Rape Dies, 6 Men Are Charged With Murder
The country’s Supreme Court ruled in 1980 that the death penalty should be used only in the “rarest of rare” cases, and fewer than 50 people have been executed since India’s independence in 1947.
The woman, who has not been identified, has become a symbol for the treatment of women in India, where rape is common and conviction rates for the crime are low. She boarded a bus with a male friend after watching a movie at a mall, and was raped and attacked with an iron rod by the men, who the police later said had been drinking and were on a “joy ride.”
She died Saturday morning in Singapore, where she had been flown for treatment for the severe internal injuries caused by the assault. She had an infection in her lungs and abdomen, liver damage and a brain injury, the Singapore hospital said, and died from organ failure. Her body was flown back to India on Saturday.
As news of her death spread Saturday, India’s young, social-network-using population began to organize protests and candlelight vigils in places like the western city of Cochin in Kerala, the outsourcing hub of Bangalore and New Delhi, the capital. Just a tiny sliver of India’s population can afford a computer or has access to the Internet, but the young, educated subset of this group has become increasingly galvanized over the New Delhi rape case.
Late Saturday afternoon, thousands of people, most of them men, filled Jantar Mantar, an observatory and popular protest ground in New Delhi, where they waved placards and shouted slogans. When Sheila Dikshit, the chief minister of Delhi, arrived there in the early afternoon surrounded by a police escort, she was booed, heckled and jostled by the crowd. Ms. Dikshit, a diminutive 74-year-old, stayed only a few minutes, lighting a candle and holding her hands together in prayer. She did not speak to the crowd. As darkness fell here in New Delhi, the crowd at Jantar Mantar lighted hundreds of candles.
Upamanyu Raju, 21, a student at Delhi University who attended the Jantar Mantar protest, said he had been protesting since a day after the rape victim was admitted to the hospital because of the “utter atrocity of what happened.”
Mr. Raju said he had given his younger sister pepper spray and a Swiss Army knife, but he worried that those things would not protect her. “It’s wrong to stop girls from going out” of the house, he said, but there is little choice because the city is so unsafe for women. According to a 2010 survey, more than a third of the women questioned in New Delhi said they had been physically sexually harassed in the previous year, but less than 1 percent reported the assault to the police.
The roads leading to India Gate, the site of earlier protests that had turned violent, were barricaded by the police early Saturday, and nearby subway stations were closed. More than 40 police units were deployed in the area, including 28 units of the Central Reserve Police Force, which are national anti-insurgency troops.
In South Delhi, hundreds of students from Jawaharlal Nehru University organized a silent march on Saturday from their campus to Munirka, the bus stop where the rape victim was picked up. The crowd of protesters trudged along a busy road, a few holding hastily made placards with phrases like “You are an inspiration to us all.”
On Saturday morning, Prime Minister Manmohan Singh expressed his “deepest condolences” to the family of the victim, who was a physiotherapy student.
“We have already seen the emotions and energies this incident has generated,” he said in a statement. “It would be a true homage to her memory if we are able to channelize these emotions and energies into a constructive course of action.” The government, he said, is examining “the penal provisions that exist for such crimes and measures to enhance the safety and security of women.”
And Sonia Gandhi, India’s most powerful female politician and the president of the governing Congress Party, made a rare televised statement that was broadcast Saturday.
“As a woman, and mother, I understand how protesters feel,” she said. “Today we pledge that the victim will get justice,” she said. Even larger protests are planned for Sunday, protesters in Delhi said, including a so-called March for Freedom from the Delhi University subway station.
Anjani Trivedi contributed reporting.
Jovem vítima de violação em grupo, num autocarro em Nova Deli
Uma jovem indiana que foi violada em grupo e barbaramente espancada num autocarro em Nova Deli morreu hoje em Singapura, anunciou o hospital onde se encontrava.
O porta-voz, Rajan Bhagat, anunciou a decisão da polícia de processar os seis homens, entretanto detidos, horas após a morte da jovem num hospital de Singapura, e acrescentou que os violadores poderão ser condenados à pena de morte.A vítima da violação coletiva num autocarro em Nova Deli "morreu em paz" hoje de manhã no hospital Mount Elizabeth, em Singapore, acompanhada da família e de representantes da embaixada indiana no país, segundo um comunicado do diretor da unidade de saúde, Kevin Loh.
Ao fim de dez dias num hospital da capital indiana, a mulher foi levada na quinta-feira para o hospital de Singapura, especializado em transplantes multi-órgãos.
Loh disse que a paciente estava em estado extremamente crítico desde quinta-feira e que na sexta-feira piorou, com os sinais vitais a deteriorar-se.
"Apesar de todos os esforços de uma equipa de oito especialistas no hospital Mount Elizabeth para a estabilizarem, o seu estado continuou a piorar nestes dois dias", disse Loh, acrescentando que a vítima sofreu "falência orgânica severa depois de danos graves no seu corpo e cérebro".
A mulher e um amigo, que ainda não foi identificado, regressavam do cinema num autocarro em Nova Deli, na noite de 16 de dezembro, quando foram atacados por seis homens, que despiram os dois, violaram a jovem e atiraram ambos do autocarro, segundo a polícia.
A polícia indiana deteve entretanto seis pessoas por suspeita de envolvimento no ataque, que deixou a jovem com graves ferimentos internos, uma infeção pulmonar e danos cerebrais.
O embaixador da Índia, T.C.A. Raghavan, disse aos jornalistas que os ferimentos eram "muito graves" e acabaram por se revelar "demasiado". Acrescentou que as autoridades estão a fazer preparativos para transferir o corpo da jovem para a Índia ainda hoje.
A violação desta jovem de 23 anos gerou uma onda de protestos na Índia, que se intensificaram com a notícia da morte. Hoje, o primeiro-ministro indiano, Manmohan Singh, disse estar profundamente triste com a morte da jovem, esperando que este caso inspire uma transformação da Índia num local seguro para as mulheres viverem.
O martírio da jovem galvanizou os indianos, com manifestações quase diárias a exigir mais proteção de violência sexual, dos apalpões às violações, que afecta milhares de mulheres todos os dias mas que não é denunciada.
O ataque pôs em destaque as atitudes da sociedade e da polícia em relação às mulheres na Índia. Manifestantes em Nova Deli reclamaram mais protecção para as mulheres e punição mais severa para os violadores.
01 novembro 2012
P'rà sopa dos pobres - Rita Rato
Grande mulher, esta Rita Rato! Ainda há vozes que defendem a democracia e a justiça social, contra os incompetentes e corruptos que nos governam.
27 outubro 2012
Eu já vivi num país assim e não gostei - Isabel do Carmo
Deana Barroqueiro
ISABEL DO CARMO
O primeiro-ministro anunciou que íamos empobrecer, com aquele desígnio de falar "verdade", que consiste na banalização do mal, para que nos resignemos mais suavemente. Ao lado, uma espécie de contabilista a nível nacional diz-nos, como é hábito nos contabilistas, que as contas são difíceis de perceber, mas que os números são crus. Os agiotas batem à porta e eles afinal até são amigos dos agiotas. Que não tivéssemos caído na asneira de empenhar os brincos, os anéis e as pulseiras para comprar a máquina de lavar alemã. E agora as jóias não valem nada. Mas o vendedor prometeu-nos que... Não interessa.
Vamos empobrecer. Já vivi num país assim. Um país onde os "remediados" só compravam fruta para as crianças e os pomares estavam rodeados de muros encimados por vidros de garrafa partidos, onde as crianças mais pobres se espetavam, se tentassem ir às árvores. Um país onde se ia ao talho comprar um bife que se pedia "mais tenrinho" para os mais pequenos, onde convinha que o peixe não cheirasse "a fénico". Não, não era a "alimentação mediterrânica", nos meios industriais e no interior isolado, era a sobrevivência.
Na terra onde nasci, os operários corticeiros, quando adoeciam ou deixavam de trabalhar vinham para a rua pedir esmola (como é que vão fazer agora os desempregados de "longa" duração, ou seja, ao fim de um ano e meio?). Nessa mesma terra deambulavam também pela rua os operários e operárias que o sempre branqueado Alfredo da Silva e seus descendentes punham na rua nos "balões" ("Olha, hoje houve um ' balão' na Cuf, coitados!"). Nesse país, os pobres espreitavam pelos portões da quinta dos Patiño e de outros, para ver "como é que elas iam vestidas".
Nesse país morriam muitos recém-nascidos e muitas mães durante o parto e após o parto. Mas havia a "obra das Mães" e fazia-se anualmente "o berço" nos liceus femininos onde se colocavam camisinhas, casaquinhos e demais enxoval, com laçarotes, tules e rendas e o mais premiado e os outros eram entregues a famílias pobres bem- comportadas (o que incluía, é óbvio, casamento pela Igreja).
Na terra onde nasci e vivi, o hospital estava entregue à Misericórdia. Nesse, como em todos os das Misericórdias, o provedor decidia em absoluto os desígnios do hospital. Era um senhor rural e arcaico, vestido de samarra, evidentemente não médico, que escolhia no catálogo os aparelhos de fisioterapia, contratava as religiosas e os médicos, atendia os pedidos dos administrativos ("Ó senhor provedor, preciso de comprar sapatos para o meu filho"). As pessoas iam à "Caixa", que dependia do regime de trabalho (ainda hoje quase 40 anos depois muitos pensam que é assim), iam aos hospitais e pagavam de acordo com o escalão. E tudo dependia da Assistência. O nome diz tudo. Andavam desdentadas, os abcessos dentários transformavam-se em grandes massas destinadas a operação e a serem focos de septicemia, as listas de cirurgia eram arbitrárias. As enfermarias dos hospitais estavam cheias de doentes com cirroses provocadas por muito vinho e pouca proteína. E generalizadamente o vinho era barato e uma "boa zurrapa".
E todos por todo o lado pediam "um jeitinho", "um empenhozinho", "um padrinho", "depois dou-lhe qualquer coisinha", "olhe que no Natal não me esqueço de si" e procuravam "conhecer lá alguém".
Na província, alguns, poucos, tinham acesso às primeiras letras (e últimas) através de regentes escolares, que elas próprias só tinham a quarta classe. Também na província não havia livrarias (abençoadas bibliotecas itinerantes da Gulbenkian), nem teatro, nem cinema.
Aos meninos e meninas dos poucos liceus (aquilo é que eram elites!) era recomendado não se darem com os das escolas técnicas. E a uma rapariga do liceu caía muito mal namorar alguém dessa outra casta. Para tratar uma mulher havia um léxico hierárquico: você, ó; tiazinha; senhora (Maria); dona; senhora dona e... supremo desígnio - Madame.
Os funcionários públicos eram tratados depreciativamente por "mangas-de-alpaca" porque usavam duas meias mangas com elásticos no punho e no cotovelo a proteger as mangas do casaco.
Eu vivi nesse país e não gostei. E com tudo isto, só falei de pobreza, não falei de ditadura. É que uma casa bem com a outra. A pobreza generalizada e prolongada necessita de ditadura. Seja em África, seja na América Latina dos anos 60 e 70 do século XX, seja na China, seja na Birmânia, seja em Portugal.
Raptado do blogue Queridas Bibliotecas de José Fanha
09 julho 2012
Execução pública de uma mulher cerca de Cabul
O Regresso à barbárie islâmica fundamentalista
Uma mulher, suspeita de adultério, mas sem direito a julgamento ou sequer a ser ouvida, é executada publicamente a tiro num povoado próximo de Cabul, mostrando que pouco mudou em relação à condição feminina no Afeganistão, após dez anos de presença internacional.
Num pequeno povoado da província de Parwan, dezenas de homens, sentados no chão ou nos telhados das casas, observam a mulher coberta por um véu. A acusada, sentada no chão empoeirado, ouve a sentença de morte sem esboçar um gesto.
"Esta mulher, filha de Sar Gul, irmã de Mustafá e esposa de Juma Jan, fugiu com Zemarai. Não a viram no povoado durante mais ou menos um mês", enuncia um homem, aparentemente um juiz, com barba longa e negra. Em seguida cita versículos do Corão que condenam o adultério.
"Mas, por sorte, os mujahedines prenderam-na. Não podemos perdoar-lhe. Juma Jan, seu marido, tem o direito de a matar".
Um homem vestido de branco recebe uma espingarda e vai postar por trás da acusada. Ao grito de "Alá akbar" (Deus é grande), o homem dispara duas vezes na direção da mulher, errando o alvo. A terceira bala atinge a cabeça da vítima, que cai por terra, o que não impede o marido de disparar mais dez vezes (por ódio ou vingança?).
Entre os presentes, apenas homens, uns aplaudem, alguns gravam a cena com seus telemóveis.
Segundo a versão oficial, Najiba, de 22 anos, foi detida pelos talibãs por ter mantido "relações" (extra-conjugais), forçadas por violação ou consentidas, com um comandante talibã rival do distrito de Shiwari, também em Parwan. A mulher foi torturada e condenada à morte. Porém, este acto bárbaro parece ser afinal um ajuste de contas entre duas facções rivais. Ela foi apenas o bode espiatório, por ser indefesa.
O ministério do Interior afegão condenou com firmeza o que chamou de "acto anti-islâmico e desumano cometido por assassinos profissionais".
Todos os meses são registrados crimes odiosos contra mulheres no Afeganistão, principalmente nas zonas rurais, que ainda se regem pelas tradições e a sharia.
Segundo a organização não-governamental Oxfam, 87% das afegãs afirmam ter sido submetidas a violências físicas, sexuais ou psicológicas, ou a um casamento forçado.
Najiba, de 22 anos, foi morta como um cão no terreno pedregoso da vila, porque a valia da mulher para o fanatismo islâmico é inferior à de qualquer animal, podendo ser morta do modo que nos revoltaria e causaria movimentos de solidariedade por todo o lado, se o víssemos fazer na Europa a uma cadela.
Contudo, estas mortes, violações e casamentos forçados não parecem incomodar a opinião pública muçulmana.
Alguma vez chegará a Primavera Árabe às mulheres dos países islâmicos?
Duvido!
(Este artigo tem por base uma notícia do Tribuna Hoje)
05 julho 2012
Serpente, alma e líbido
Veloz como o relâmpago, a serpente visível surge sempre de uma abertura escura, fenda ou racha, para cuspir a morte ou a vida antes de voltar para o invisível.
Ou então abandona esta aparência masculina para se tornar feminina: enrola-se, enlaça, aperta, sufoca, engole, digere e dorme. Esta serpente fêmea é a invisível serpente-princípio que reside nas camadas profundas da consciência e nas camadas profundas da terra. É enigmática, secreta, não se pode prever as suas decisões, repentinas como as suas metamorfoses. Brinca com os sexos como com todos os contrários; é fêmea e macho, gémea em si mesma, como muitos deuses criadores que são sempre, na sua primeira representação, serpentes cósmicas.
A serpente visível só aparece como breve encarnação de uma Grande Serpente Invisível, causal e atemporal, senhora do princípio vital e de todas as forças da natureza. É um velho deus primordial que encontramos no ponto de partida de todas as cosmogeneses. É o que anima e o que mantém. No plano humano, é o duplo símbolo da alma e da líbido.
Dicionário dos Símbolos - Jean Chgevalier e Alain Gheerbrant
Reedição
Tentação da Serpente é uma reedição de O Romance da Bíblia, publicado em 2010, onde pretendi fazer, partindo dos estereótipos do Antigo Testamento, uma saga histórica, mas também poética, sensual, irónica e dramática das mulheres da Antiguidade, que viviam confinadas nas tendas de pastores nómadas ou nos haréns e serralhos dos palácios dos faraós do Egipto ou dos reis da Pérsia e Mesopotâmia, cujos ambientes são recriados com o maior rigor a partir de uma cuidada pesquisa em documentos da época e em obras de História das civilizações pré-clássicas.
Devido aos problemas causados pela distribuidora Sodilivros, que são do conhecimento público, os exemplares de "O Romance da Bíblia" foram retirados do mercado e substituídos por esta nova edição - com um título que retrata melhor o tema e a intenção da obra do que o anterior - que foi entregue a outra distribuidora para poder chegar aos meus leitores de todo o país.
Nota: Tentação da Serpente apenas difere de O Romance da Bíblia no título e capa.
15 junho 2012
Reconhecimento
Foi uma honra ter o meu conto "Os Langores de Holofernes" analisado pela Professora Lyslei de Nascimento, da Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil, na sua palestra "Crime e redenção: mulheres que matam", no I Congresso de Cultura Lusófona Contemporânea, realizado em Portalegre, nos dias 11 e 12 de Junho.
"O Romance da Bíblia" está a ser objecto de estudo de uma tese de Mestrado na Universidade de Minas Gerais, Brasil; O Navegador da Passagem serviu de objecto de estudo e tradução na Universidade de Bolonha/Forli, em Itália.
É engraçado ver as minhas obras como estudo nas universidades estrangeiras e ser praticamente ignorada pelos Media portugueses.
PORTALEGRE ACOLHE CONGRESSO DE CULTURA LUSÓFONA CONTEMPORÂNEA
A Escola Superior de Educação de Portalegre acolheu nos dias 11 e 12 de Junho, o I Congresso Internacional de Cultura Lusófona Contemporânea. Uma iniciativa promovida por este estabelecimento de ensino em parceria com Universidade Federal de Juiz de Fora (Brasil) , que tem por objectivo instituir-se como um espaço de discussão e reflexão em torno das questões de género nas literaturas de expressão portuguesa contemporâneas, nomeadamente no que à autoria e às representações literárias do feminino diz respeito.
A conferência de abertura foi da responsabilidade da escritora portuguesa Maria Teresa Horta.
Ainda no Congresso, foi exibido o filme português "Florbela", inspirado na vida e obra de Florbela Espanca, no dia 11, pelas 21.30, no auditório da ESEP e que, no final, contou com um debate com a presença do realizador Vicente do Ó.
Destaque ainda para a Feira do Livro que decorreu nos dias 11 e 12 na ESEP, aberta a toda a comunidade, e para a exposição de pintura que estará patente na Biblioteca Municipal.
O Congresso teve lugar nos dias 11 e 12 de junho de 2012, sendo subordinado aos seguintes subtemas:
1. Literatura e autoria feminina: vozes, percursos e modos de ver o mundo
2. Texto, género e linguagem: as potenciais marcas do feminino
3. Modalidades de escrita no feminino: diários ficcionais e narrativas epistolares
4. Representações da mulher na literatura de autoria masculina ou feminina: a (des)construção do estereótipo
5. Sujeitos textuais e construção da identidade feminina: auto-perceção e (in)aceitação de si; corpo: totalidade e fragmentação
6. Identidade feminina e alteridade: a poética do (des)encontro
7. Representações da mulher no Cinema e outras Artes: a (re)configuração do cânone e da identidade.
Patrícia Azevedo (FER TV JORNAL)
28 fevereiro 2012
"O Sacrifício dos Circuncisos" na Arquivo Maaravi

03 janeiro 2012
Vera Helena Sopa recomenda esta obra
O romance é uma reedição de outras duas obras da autora sobre lendas, parábolas e histórias do Antigo Testamento, com as suas personagens sacralizadas, mas escrutinadas do ponto de vista feminino e focando a condição da mulher. Foi esta a razão porque me interessei por ler este livro.
Assim, descobri um romance sensual, erótico, poético e muito violento, sobre uma época em que a falta de ética e moral originava um tremendo sofrimento e luta constante pela sobrevivência e integridade.
Não é possível o distanciamento, porque existe a clara noção de que não se trata de mera ficção, porque sabemos que esta obra é resultado de uma apurada pesquisa e investigação sobre o que existe documentado.
As mulheres eram propriedades, adquiridas por contrato, um bem que se dá, se troca ou se vende, segundo o interesse da família. Não eram consultadas ou ouvidas sobre os seus sentimentos e as suas vontades e o seu destino era consoante outros o designassem. Ora uma maldição, ora uma bênção, conforme a sua beleza, sagacidade, ou sorte.
Por tudo isto, penso que este livro é realmente de interesse colectivo. Absolutamente.
Publicado no blogue Ler, um prazer adquirido
Crítica de Inês Montenegro
Deana Barroqueiro pegou nas passagens do Antigo Testamento em que a mulher tem – ou deveria ter – um lugar de destaque e desenvolveu-as neste livro com uma escrita aprazível e sensual, pormenorizando o que já de si era uma mistura de lendas com factos e inserindo-lhes ainda um factor de ficção e de romance histórico.
No conjunto, ficamos com um enredo que tanto pode ser encarado como contínuo, como um conjunto de contos, capaz de nos despertar emoções variadas – embora, por minha parte, a indignação pelo que a maioria das mulheres retratadas tinham de acatar fosse aquele que mais predominou.
Desengane-se quem espera querelas religiosas ou romances de cordel. Belas, práticas, melífluas, ciumentas, espertas, enganadoras, justas, injustas, sapientes, invejosas ou inocentes, todas estas mulheres têm em comum uma personalidade forte e vincada que se torna no centro do enredo.
Sem dúvida recomendado, mas algo que se deverá ler com calma, sem pressas ou divagações.
Ver mais no Blogue Tales of Gondwana
10 maio 2011
Cuentos Eróticos del Antiguo Testamento - de Deana Barroqueiro

En “Cuentos eróticos del Antiguo Testamento” (colección “Eros y Psique”, Plurisingular Ediciones, S.L.) Barroqueiro reescribe cuentos basados en relatos de alto componente erótico de la Biblia, historias apenas conocidas por muchos de nosotros, y que sin embargo están en la imaginería colectiva.
Pese a que en algunas de las historias se perciben episodios de suma crueldad o abuso degradante de la mujer, la autora sabe alcanzar la elegancia narrativa evitando el lenguaje obsceno y buscando sensualidad y poesía en sus palabras.
Copio un párrafo de la historia de Abraham cuando peregrinando por el desierto con su tribu, encuentran la tierra prometida y montan una fiesta orgiástica de vino, sangre y sexo a las que eran tan aficionados nuestros ancestros:
Todos expresaron su júbilo y un altar fue alzado en honor del Dios único de Abraham. Esa misma noche, en el campamento, después de montar las tiendas, sacrificaron ocho corderos e El Shaddai, y cantaron y bailaron como hacía mucho tiempo no lo hacían, rociándose con la sangre del holocausto y el vino, reanimando el placer de los sentidos en los cultos ancestrales.
Los músicos tocaron canciones de amor ardiente que ponían alas en los pies y las cabezas mareadas a todas las mujeres y mozas, libres o esclavas, que soltaban sus cabellos y dejaban entrever entre los vestidos abiertos y desaliñados los pechos y los muslos brillantes de sudor, vibrando al ritmo de aquella música endiablada. Celebraban, en la danza salvaje y la sangre de los sacrificios con la que se hissopaban, dibujando en los cuerpos misteriosos símbolos, no de El Shabbai, el Dios desconocido, si no a Ishtar, la diosa de la fecundidad y el amor. Calentados por el vino, los hombres las perseguían como sátiros, aspirando en el aire ese olor fuerte mezcla de sangre, sudor y perfumes que tanto los excitaba, buscándolas en las tiendas o en los rincones oscuros del campamento, tumbándolas en el suelo y penetrándolas con una violencia animal ausente de ternura,usando sus cuerpos como un vaso en el que aliviaban una tensión acumulada e insoportable.
Abraham quería poner fin a los desmanes de su gente, pero no sabía como hacerlo. En el fondo, no eran culpables de un crimen. La fornicación, los excesos y la propia brutalidad formaban parte del culto de Ishtar que todos conocían y, en cambio, nadie sabía cómo adorar a El Shaddai, el Dios único de la tierra prometida.
por Susana Moo
17 fevereiro 2011
Uma Leitura do Romance

(como trincar cascas de laranja cristalizadas com chocolate ou qualquer fruto mal maduro...)
Isto porque se eu quisesse propor um subtítulo, ou antes, se calhar, uma espécie de epígrafe para Tentação da Serpente/O Romance da Bíblia escolheria inspirar-me num excerto deste mesmo livro (p. 152) e que seria qualquer coisa como: o romance da “vulgaridade humana” (desnudada da) “compostura cerimoniosa” (...) “polida e brilhante”.
Logo no conto “No início”, o feitiço volta-se contra o feiticeiro na medida em que Deus amaldiçoa e castiga o que, afinal, criou à sua imagem – o homem e a mulher.
Como diz Teresa Horta no prefácio: “Deus não gostou do que fez”.
E como afirma a narradora na p. 52: “O homem é a sombra de Deus mas o escravo é a sombra do homem livre”.
No entanto, e apesar da sua insatisfação e descontentamento, Deus concede-lhes o benefício da dúvida e, condescendentemente, indica-lhes – ao homem e, por inerência, à mulher até porque (como recita Rebeca, p.109) “(...) a mulher é o futuro de um homem (...)” – o caminho e o destino através do SONHO.
Até porque, tal como afirma a narradora, na p. 42, “Os Deuses criaram os sonhos para indicar o caminho aos homens quando eles não sabem ver o futuro”.
O sonho, que vai ritmando o universo ficcional de cerca de 13 dos 19 contos/capítulos deste romance como uma espécie de refrão ou “leit-motiv”, é o instrumento divino ou sagrado ou ainda voz inquestionável que, a um tempo, determina e sanciona, revelando-se como única fonte de conhecimento porque meio intercomunicador entre a dimensão mística e mágico/fabulosa do sobrenatural religioso e a dimensão material e quantificável do quotidiano terreno e humano que dá ao homem a segurança de premonitoriamente ver/saber o futuro.
O sonho como fonte de conhecimento é, afinal, transversal a quase todos os contos mas vai adquirindo contornos que se actualizam de acordo com a vontade imperativa dos deuses e as necessidades básicas da sobrevivência humana ou, se calhar, o homem precisa de legitimar as suas decisões e comportamentos pela memória, às vezes translúcida, de uma voz de Além:
No 1º conto, “Arca de Noé”, o sonho implica obrigação, isto é, agir como manda a voz do princípio criador porque contrariá-la significaria inexistir. E assim, provavelmente, não estaríamos agora, aqui, a discorrer sobre Noé e as aventuras do Velho Testamento...
Por isso, não mais o carácter obrigatório do sonho se impõe ao simples mortal, manifestando-se, já no 2º conto, como o desejo de partir em demanda de, também significando, ao longo dos contos lidos, promessa, protecção, segurança, premonição de bênçãos, profecia de futuro – ou seja, o sonho traduz os anseios solares mais veementes e importantes do bicho infinitamente pequeno que é o homem e a mulher – por um lado – mas espelha igualmente o desejo de poder, sancionando a mentira de conveniência, exigindo a cobrança de dádivas já magnanimamente concedidas pelos deuses, ameaçando com pesadelos de sobressalto, preparando sensorialmente rituais de acasalamento, profetizando a fecundidade ( que é riqueza e estatuto no homem e possibilidade de viver e de existência na mulher ) – por outro lado – ou seja, o infinitamente grande orienta e concede a concretização dos destinos desculpabilizando e sublimando, através do sonho e/ou da voz profética, os desesperos, as ambições, os interesses, as astúcias, as mentiras, as culpas, as vinganças, os excessos, as seduções, a luxúria, a supremacia dos poderes que se jogam às escondidas pelos nossos trilhos lunares.
Afinal, a Deana não se divertiu a sós com ela!
A Deana brinca connosco: usando o sonho e a voz dos deuses – primeiro – e, a partir do 9º conto, – depois – a dos seus mandatários feitos homens e uma mulher ( a profetisa Débora do conto “ A dívida de Sisara” ), a Deana tira-nos o retrato, acutilantemente, com o seu sorrisinho matreiro e vivo! Põe a nu, literalmente, a nossa condição humana.
Mas dá-nos, no último conto, um conselho por sentença:
“Não ponhas a tua crença e confiança em reis e príncipes” (p. 344), sejam eles deuses (simbolicamente falando), profetas ( miticamente falando ) e, sobretudo, homens ( autocraticamente falando ).
A função do sonho ou da voz profética entrelaça-se, assim, na vida quotidiana dos que, apesar da sua condição terrena de mortais, têm poderes para interpretar e agir sobre os tempos, os espaços e, principalmente, sobre o outro, sobretudo se for mulher .
Lembro-me, por exemplo, da viagem iniciática de Noé, da predestinada demanda do lugar sagrado das terras da Palestina por Abraão, da construção e sagração cosmogónica de Bethel por Jacob, do dom de visão premonitória de José ( filho de Jacob ) ou da devolução de Sara ao marido Abraão por Abimalec, o amante raptor, apenas porque um pesadelo lho ditou.
A dimensão pragmática do sonho e/ou das vozes cúmplices serve igualmente um outro tipo de conhecimento que é o da sabedoria prática mas ardilosa, astuciosa do ser humano, fabricador de mentiras de conveniência, persuasoras e provocadoras de comportamentos.
As intrigas de todos os contos dinamizam-se pelo jogo de tensões e seduções conduzidas pelo homem e pela mulher, assentando, quase sempre, na mentira disfarçada de verdade, ora protagonizada por um, ora pela outra – segundo os fins a atingir: os do homem porque mede a sua existência pela pujança da sua virilidade, pelo poder de ser dono de mulheres férteis, de ter numerosa prole e de ostentar abundâncias e riquezas; os da mulher, tradicionalmente obreira de procriação e moeda de troca, sem direitos – a não ser na medida em que ao homem lhe fosse conveniente e benfazejo – enquanto defende, calculadamente, o seu direito a existir pelas premeditadas consequências que as perversidades, as luxúrias, as astúcias e as mentiras exercem nas reacções e decisões dos homens, já que a percepção do mundo é masculina.
A mentira é, assim, o alicerce da dignidade masculina e a garantia da liberdade e do livre arbítrio femininos, como único caminho de dizer “basta” a todo o tipo de humilhações aqui descritas que a narradora bem sintetiza nas palavras sábias proferidas pela rainha Vashti, repudiada pelo rei Xerxes I da Pérsia porque ousou fazer-lhe frente, opondo-se à ordem de exigir a sua presença junto dele:
“Não te entregues como escrava a nenhum homem” ( in “O Ardil de Ester”, p.326 ).
A vida – e até a morte – de reis e rainhas, concubinas e escravas, eunucos e guerreiros e demais gente do povo decorre, oficialmente, no embuste e o faz-de-conta “abençoados” pelos sopros sibilantes do Além.
Interessante é que, à medida que vamos progredindo na leitura destes contos, damo-nos conta de que a submissão e obediência da mulher – e correspondente trama de mentiras do homem – evoluem de modo inversamente proporcional à preponderância masculina: de facto, a revolta pela sua condição vergonhosa e aviltante vai urdindo a manha da mentira, disfarçada de verdade, tal como – afinal – foi aprendendo, talvez sem querer, com os homens que, de uma maneira ou de outra, a foram tocando.
E...
“Quem quebra a cerviz, não quebra os rins” ( p.145 )
A hipocrisia masculina vai, por consequência, dando lugar à hipocrisia feminina mas isso acontece sobretudo a partir conto V, “O harém de Jacob”, para se acentuar no conto VII, “A esposa do eunuco”, no conto VIII, “As provações de Judá”, no conto IX, “A dívida de Sisara” onde se acrescenta à mulher ardilosamente vingativa a solidariedade conivente e cúmplice da pitonisa Débora que, juntas, vencem a preponderância masculina.
Também no conto X, “As matanças de Sansão”, a desonestidade e a traição de Dalila determinam a tragédia que, agora, é dádiva de vida do próprio Sansão.
E fica a sentença:
“Não contes segredos a uma mulher” ( p. 341 )
Contudo, é só no último conto, “O Ardil de Ester”, que as artimanhas que servem o jogo de interesses das amas das concubinas do Rei, em especial de Andya, ama de Ester, igualam as dos eunucos, guardiães das mulheres, em especial Hegai, eunuco protector de Ester, resultando a supremacia da mulher que consegue já determinar a sua vida pela esperteza que se sobrepõe à do rei Xerxes I da Pérsia que, de resto, chega a comportar-se caricaturalmente como uma criança manipulada que só terá o “brinquedo” desejado quando a cumplicidade feminina de Ester e da sua ama Andya o permitir.
Assim sendo:
“ Vale mais um homem paciente do que um herói” ( p. 221 )
- nem que a isso obrigado seja – acrescento eu.
E:
“a mulher formosa alcançará glória e o homem diligente alcançará fortuna” 8 p, 222 ) ainda que , mesmo assim,
“as sortes lançam-se no regaço mas é o senhor quem decide” ( p. 222 )
Planando sobre Tentação da Serpente/O Romance da Bíblia, diria que, apesar de tudo, a mulher ascende a um lugar confortável, mais respeitado ou, pelo menos, equilibrador, no patamar cimeiro de um qualquer zigurat cujo primeiro socalco, dominado pelo homem como princípio gerador – ainda que “por mandato” – e investido de poder deliberativo, sentenciador, executante e, sobretudo, de progenitor, inicia, degrau a degrau, a textura enredada de outros tantos solavancos como as arbitrariedades do poder, a mentira, a astúcia, suportadas pela reminiscência da voz sonhada que credibiliza, ao fim e ao cabo, a repetição simbolicamente monótona dos gestos brutais e pantanosos deste universo masculino e as ousadias frágeis e debilmente dinâmicas deste universo feminino.
O romance é um olhar-síntese unificador de tempos porque segreda – e às vezes grita – a inquietação das culpas herdadas, das violências ancestrais, das vinganças primordiais, a discussão surda e latente das supremacias dicotómicas sempre excessivas e desgastantes mas também segreda e, às vezes, grita a percepção da simbiose fluida do espírito e do corpo, da essência do ser e da força vital e sexual que são o nosso próprio GENESIS e nos fazem.
Pena é que o nosso percurso tenha começado de boa fé e má consciência e tenha evoluído pela má fé e boa consciência: este não é, decerto, o caminho da dignidade e do respeito justos do homem e da mulher.
No fundo, o mundo dos arquétipos essenciais mantém-se; só a forma como os recheamos é diversa ao longo dos tempos, actualizando-os da amálgama subconsciente – e, por vezes, consciente – das memórias herdadas.
Penso que é de tudo isto que a Deana nos fala através do seu olhar especulativo, do seu dizer duro e mordaz, por um lado, e desassombrado e divertido por outro.
Não é a Deana que acredita que:
“o coração alegre cura o corpo, o espírito triste seca os ossos”? ( p. 221 )
Maria Manuela Martins Gamboa
13 novembro 2010
O que dizem os Leitores
Trata-se de uma narrativa na qual desfilam as personagens mais conhecidas (e outras nem tanto) do Antigo Testamento, sempre descritas com traços de ironia e humor negro.
As personalidades masculinas apresentam-se-nos fatalmente humanas e manipuláveis pelas femininas que, tendo em conta as circunstâncias que lhes são oferecidas, tentam guiar o curso da história.
Esta é uma história que não tem um carácter puramente ficcional, atingindo-nos a violência, a sexualidade e a maldade por vezes descritas, levando-nos a reflectir uma vez mais sobre o papel da mulher ao longo da História.
Gostei!"
Patrícia Pereira (Segredo dos Livros) 19/11/2010
A dedicatória conquistou-me logo. Ia em busca de um livro para oferecer a uma amiga pelo aniversário e veio o seu - vezes dois! Porque ofereci um e trouxe outro exemplar para mim. Porque delas também reza a História."
ianita (Paraíso do Inferno) 5/08/2010
"O romance é uma reedição de outras duas obras da autora sobre lendas, parábolas e histórias do Antigo Testamento, com as suas personagens sacralizadas, mas escrutinadas do ponto de vista feminino e focando a condição da mulher. Foi esta a razão porque me interessei por ler este livro. Assim, descobri um romance sensual, erótico, poético e muito violento, sobre uma época em que a falta de ética e moral originava um tremendo sofrimento e luta constante pela sobrevivência e integridade. Não é possível o distanciamento, porque existe a clara noção de que não se trata de mera ficção, porque sabemos que esta obra é resultado de uma apurada pesquisa e investigação sobre o que existe documentado. As mulheres eram propriedades, adquiridas por contrato, um bem que se dá, se troca ou se vende, segundo o interesse da família. Não eram consultadas ou ouvidas sobre os seus sentimentos e as suas vontades e o seu destino era consoante outros o designassem. Ora uma maldição, ora uma bênção, conforme a sua beleza, sagacidade, ou sorte. Por tudo isto, penso que este livro é realmente de interesse colectivo. Absolutamente."
"Um galeria de mulheres do Antigo Testamento pintadas com mestria pela autora e que nos dão um retrato diferente daquele que lemos na Bíblia. Uma Sara (mulher de Adão) libidinosa e sedutora, a mulher de Onan cheia de malícia e ardis... para só citar 2 de tantas que a Deana nos traz com outras cores. Gostei muito. Um livro que se lê muito bem, mas que denota um profundo conhecimento da Bíblia e uma exaustiva investigação em textos da época, com a citação de vários poemas encontrados em livros antiquíssimos e de que gostei muito. Recomendadíssimo!"
"Diz Maria Teresa Horta no prefácio que a Bíblia nos apresenta um “Velho Testamento moralista, repleto de anciãos preguiçosos, libidinosos e lascivos, de brutamentes ignorantes e violadores, convocados por um Deus irado frente à própria incompetência e à própria imagem, segundo a qual teria criado o homem, de quem afinal não gosta e castiga.” É contra esta visão que a autora se insurge, trazendo para a ribalta um lote de mulheres que, ao longo da história do povo judeu, estiveram longe de ser as esposas fiéis, as concubinas dóceis e as escravas submissas."
24 outubro 2010
A Cozinha Afrodisíaca e a Bíblia
Em muitos lugares onde se passam os episódios de "O Romance da Bíblia", a cozinha afrodisíaca ou erótica era levada muito a sério, sendo mencionados em muitos episódios produtos e pratos que tinham como fim, não apenas deliciar o palato, mas sobretudo avivar os apetites do corpo e tornar as paixões mais fogosas.
No Egipto ou no Líbano, por exemplo, as folhas e as sementes do feno-grego (que se crê terem sido aí introduzida pelos Fenícios) eram usadas como especiarias ou acompanhamento de certas iguarias afrodisíacas, como o Koubbé ou o Taboulé (criado em homenagem a Astarte, a deusa do amor e da fecundidade). Aqui vos deixo a receita, reconstituída por Pino Correnti no seu livro "Cinco Mil Anos de Cozinha Afrodisíaca":
Taboulé de Astarté
Para 4 pessoas
250 g de feno-grego; 250 g de sêmola fina de trigo; 1 kg de tomates não muito maduros; 250 g de cebolas brancas; 250 g de cebolas verdes; 1 dl de azeite; 1 limão; 1/2 ramo de salasa picada; 10 folhas de hortelã-pimenta; 1 cesto de parras comestíveis; sal e pimenta preta moída no momento.
Deite o feno-grego e a sêmola numa peneira fina e deixe correr sobre ambos um pouco de água, para molhar bem os dois ingredientes. Misture com as pontas dos dedos e deixe escorrer antes de os espalhar sobre uma bandeja, a qual deve estar 30 m ao calor, a fim de lhes suprimir o excesso de humidade.
Entretanto pique finamente as duas variedades de cebolas e corte os tomates em pedaços. Em seguida, numa saladeira grande, misture-os com o feno-grego e a sêmola e mexa tudo com o azeite, sumo do limão, a salsa e a hortelã picadas. Tempere de sal e pimenta e deixe repousar a preparação no frigorífico durante 15 a 20 m.
No momento de servir, divida por quatro pratos, cada um deles guarnecido por três parras (que poderá substituir por folhas de alface). Ponha o cesto das parras no centro da mesa e convide os convivas a comer com os dedos, enrolando pequenas porções de taboulé nas folhas.
Nota: Não se esqueça de que os bagos de romã eram considerados como poderoso afrodisíasco. Hades, o Senhor dos Infernos, ofereceu-os a Proserpina, depois de raptar e levar para o Reino das Sombras, para que, comendo os rubis de fruta, já não pudesse ou quisesse deixá-lo. Estamos no tempo no tempo das romãs...
28 agosto 2010
De "El Romance de la Biblia" para los amigos de España

Jacob había pasado a llamarse Israel, tras su fuga de las tierras de Labán, cuando, durante toda una noche, se enfrentó con un ser misterioso, en las orillas del río Jordán. Al terminar la lucha, aunque se negó a desvelar su propio nombre, su adversario le dijo: “En adelante ya no te llamarás Jacob, sino Israel, pues has luchado contra un ser celeste y has permanecido fuerte,” y le bendijo. El hijo de Isaac dio gracias al Señor y llamó a aquel lugar Panuel, es decir, “la cara de Dios”, pues no le quedaba ninguna duda de que había visto un ser divino cara a cara y, a pesar de ello, había logrado conservar su vida, saliendo de aquella contienda victorioso, aunque cojeando de un muslo.
Estaba convencido también de que la bendición de aquel extraño ser lo protegiera, pues su encuentro con Esaú, pocas horas más tarde, había sido muy cordial, como si su hermano se hubiera olvidado de los antiguos agravios, perdonándole, sin que ya cupiera en su corazón el rencor ni el deseo de venganza.
Prefiriendo no arriesgar, todavía, Israel abandonó la región de Jarán siguiendo las dos enormes caravanas que transportaban sus bienes, recorriendo un largo camino hasta penetrar en la región de Sucot, junto al monte Garizim, en el país de Canán, donde decidió montar su campamento, a la entrada de la ciudad de Salem, en la margen izquierda del río Jordán. Allí compró a los hijos de Jamor, el jorreo que gobernaba el país, por cien monedas, una parcela de tierra sobre la que levantó sus tiendas, para establecerse en ella con sus mujeres, Lía y Raquel, y sus concubinas Bala y Zelfa, sus once hijos y todos los siervos y siervas que había ido adquiriendo, así como los hombres y mujeres libres que se habían unido a su familia.
Cuando ya estaban instalados, Jacob, ayudado por sus hijos mayores y por los hombres principales de su casa, levantó un altar a El Shaddai, el Dios de su padre y de su abuelo, que ungió con óleos, dándole el nombre de “El Elohe Israel”, el Dios de Israel. A este Dios sacrificó un becerro y dos corderos de los más gordos que había en su rebaño, para que el Altísimo les ofreciera su protección, haciendo que la población del lugar les aceptara favorablemente.

Algunos días más tarde, Dina, la hija que Lía había dado a Jacob, salió del campamento y se dirigió al río para trabar conocimiento con las mozas del pueblo. Por un extraño azar, o tal vez porque, en el momento de fecundar a Lía, Jacob tuviera, como solía tener, el pensamiento y el alma puestos en Raquel, la doncella había heredado el cuerpo de su madre, de formas voluptuosas y perfectas, pero, en vez de su fealdad, había sido bendecida con un rostro hermosísimo, que se parecía al de su tía como una gota de agua se parece a otra gota de agua. Incluso su larga y negra cabellera tenía esa misma suavidad y brillo que había hecho a Raquel tan celebrada en su juventud por todos los cantores en las fiestas del esquileo de los rebaños.
Siquem, el hijo primogénito de Jamor, estaba cazando con dos criados cuando la vio atravesar el bosque. Joven e impetuoso, acostumbrado a satisfacer todos sus caprichos, se inflamó de deseos de la muchacha y, haciendo señal a sus compañeros para que lo siguieran, se lanzó en persecución de la gentil presa, empleando los mismos cuidados con los que se acercaría a una gacela, antes de disparar sobre ella la mortífera flecha.
Cuando Dina se dio cuenta del peligro que corría, al ver a un hombre que la acechaba detrás de unos árboles, ya era demasiado tarde. ¡Estaba cercada! Con el corazón latiéndole desbocado, intentó retroceder, hacia la seguridad que le brindaba el campamento paterno, pero otro hombre le impedía el camino por ese lado; corrió entonces en dirección al río, donde poco antes había visto a algunas mujeres lavando ropa, y fue a caer en los brazos de Siquem, que se cerraron en torno suyo como el lazo de una trampa.
—¿Qué quieres de mí? ¡Deja que me vaya! —suplico Dina, con la voz temblorosa, pero sin gritar—. ¡Déjame volver a casa con mis padres!
—No te asustes, gentil pastora, que no te haré ningún mal —su cazador le hablaba al oído, dulcemente, jadeando un poco, como si también él estuviera cansado de la carrera—. ¡Qué hermosa eres! Dime, ¿cómo te llamas, belleza? ¿Qué puedo hacer para obtener tus favores?
A cada nueva pregunta que le hacía la estrechaba con más fuerza, como si quisiera fundirla en el calor de su cuerpo. Ya en el momento de caer en la trampa que él le había preparado, a pesar del miedo y la aflicción que sentía, Dina había advertido, nada más mirar a su agresor, la juventud y belleza masculina de éste. Ahora, pegada al cuerpo de él como un embutido de carne, sus sentidos se impregnaban de otras impresiones que la confundían y turbaban. Los músculos y los tendones de aquellos brazos, que se cruzaban por delante y le rodeaban la cintura como una argolla de acero, pero al mismo tiempo con una delicada ternura, se movían flexibles y poderosos bajo una piel cobriza tan suave como la de una mujer. De él emanaba un agradable olor a esencias preciosas y su voz, dulce y susurrante, mostraba que no era un campesino, sino un señor. Dina se debatió entre sus brazos, intentando soltarse, pero el atrevido cazador no aflojó el lazo y ella suplicó nuevamente:
—Pareces un hombre de bien. Yo me llamo Dina y soy hija de Jacob y Lía, de la tribu de Abraham. ¡Suéltame, por tu honor, y mis padres te estarán siempre agradecidos!
Siquem le mordisqueó la oreja, sumergiendo la nariz en la pesada cabellera que se había soltado durante la carrera y se echó a reír, divertido, exclamando en un tono de dulce persuasión:
—¡Siendo virgen y tan bella como eres, puedes tener todo cuanto desees! No debo consentir que malbarates tus encantos en el camastro maloliente de cualquier pastor. Tú eres digna de un señor de tierras, como yo, hermosa Dina.

Le besó la nuca y el cuello, cada vez más despacio, el deseo subiendo como una ola de fuego por el cuerpo. Sus compañeros, que se mantenían a una distancia prudencial, divertidos con la escena, se pusieron a recitar en coro un fragmento de un antiguo poema, a modo de respuesta de la joven a la provocación de su señor.
¡Excítate, excítate! ¡Abrásate, abrásate!
Encélate como un venado,
Caliéntate como un toro salvaje.
¡Haz el amor conmigo seis veces, como un corzo,
Siete veces, como un ciervo,
Doce veces, como un macho de perdiz!
Haz el amor conmigo porque soy joven.
Haz el amor conmigo porque soy ardiente.
¡Haz el amor conmigo como un corzo!
Yo, protegido por el dios Ningirsu,
Yo te aplacaré.
Él se rió al oírles y les hizo señal para que le acercaran el carro que lo había conducido allí, lejos de casa, en busca de terrenos de caza, y se absorbió de nuevo en la seducción de su presa, con el lóbulo de la oreja de ella preso en sus labios, recorrido lentamente por su lengua, como si lo saborease, murmurando:
—Mi nombre es Siquem. Soy hijo de Jamor, el gobernador de estas tierras. ¡Como ves, no podías haber caído en mejores manos! —Y repitió: ¿Qué puedo hacer para obtener tus favores, mi bella Dina?
La hija de Lía movía la cabeza a uno y otro lado, con el fin de escapar a los besos cada vez más ardientes del joven cazador, e intentaba en vano apartar con sus manos aquellas manos que le exploraban el cuerpo y le causaban un extraño sentimiento en el que el miedo, la vergüenza y el placer se mezclaban, calentándole la sangre y la piel como si tuviera fiebre.
—No abuses de mí, porque no sabré vivir si me deshonras —suplicó con la voz sofocada. —Y mis hermanos han de vengar la ofensa.
Pero Siquem ya no oía la voz suplicante de la joven, y mucho menos escuchaba la voz de su conciencia, ajeno a todo lo que no fuera el grito de los sentidos, convertido en un aullido latiendo desenfrenadamente en su sien, clamando más alto que cualquier otro sonido por la proximidad de aquel cuerpo femenino, cuyas formas delicadas y sinuosas sentía bajo sus dedos (a pesar del tejido basto de su vestido de pastora que, sin embargo, no lograba esconder su perfección), de la carne tibia y tersa que se retraía temblorosa al roce de sus manos inquietas, que la acariciaban a ciegas, cada vez más atrevidas y golosas en busca de los lugares secretos e intocados de aquel cuerpo de niña-mujer.
La hizo rodar hasta quedar frente a frente y la apretó contra sí, con una violencia que la hizo arquearse y soltar un gemido. ¡Qué bella era, la nómada! Siquem casi creía tener en brazos a una encarnación de Ishtar o incluso de Inanna, la más antigua de todas las diosas del amor, celebrada por los viejos aedos que concurrían a las fiestas de la siega. La cabeza de ella le llegaba a la altura del pecho y sus senos, pequeños y redondos como frutos tempranos, se enterraban en el vientre, mientras la cadera, nerviosa como la de una gacela, le apretaba el sexo, mareándole de deseo.

Dina le veía el rostro moreno, de cabellos de azabache, los ojos grandes, oscuros y profundos, que la miraban con una especie de adoración y anhelo como ella nunca había visto en otros ojos y se cerraban cuando la besaba y la acariciaba, como si quisiera aislarse de todo cuanto los rodeaba para sentir mejor el placer de sus caricias, el olor de su cuerpo, la piel erizada de miedo y de algo más, cualquier otra cosa de indefinible que en aquel momento la hizo soñar con la celebración de sus esponsales, en brazos del novio escogido por la familia, pero cuyo rostro y cuyo cuerpo se confundían con los de aquel apasionado conquistador.
Sin dejar de besarla, él la cogió en brazos y se dirigió al carro que los criados le habían traído para transportar en él la preciosa presa hasta la cabaña donde guardaba las armas y solía pernoctar durante sus interminables jornadas de caza, y donde a veces se regalaba con una corza apetitosa, recién acabada de abatir.
Siquem desfloró a Dina no con la violencia o el odio del violador, sino con la ternura de un esposo en su primera noche de bodas, cuidando no asustar, ni hacer daño a la novia muy amada, porque, por un extraño capricho de los dioses o de la suerte imprevisible, el alma del hijo primogénito de Jamor se había atado irremediablemente a la doncella nómada desde el momento en el que la había perseguido en el bosque. Acostado a su lado, en el pobre jergón de la cabaña, la abrigó con sus brazos, lleno de amor, y habló a su corazón:
—No llores, mi vida, porque juro por todos los dioses del templo de Salem que tú serás mi esposa si, por bondad, me perdonas lo que te he hecho y caigo en gracia a tus ojos.
Dina lloraba en silencio, menos por la pérdida de su virginidad que por el tumulto de sentimientos que Siquem le había provocado, acercándose a ella y conociéndola por la fuerza. Sus besos y las caricias de sus manos todavía perduraban en su piel, lo mismo que el fuego sentido en su vientre cuando el sexo del violador la penetró el cuerpo como una lámina al rojo, rasgándole la carne y la inocencia, provocando en ella dolor y placer, hiriendo y al mismo tiempo cicatrizando el cuerpo violentado.
Las palabras que le había susurrado al oído mientras le robaba la flor de su virginidad tenían la suavidad y la belleza de un cantar, dulcificando el dolor y la humillación como un bálsamo, y, al oírlas, ella había deseado en lo más secreto de su alma que él no se callara nunca y la enredase en la tela de palabras que hablaban de gozo y de pasión, cuyo sentido escapaba en ocasiones a su entendimiento de muchacha inculta, pero del que captaba su entonación y la vibración en el escalofrío de la piel o en el despertar de una multitud de sensaciones desconocidas. Y el jorreo quería reparar el mal que le había causado, casándose con ella. ¿Sería verdad que la amaba, entonces? Pero ella no era más que una simple pastora nómada, ignorante y rústica, mientras que él era un joven rico y extranjero, hijo primogénito de Jamor, el gobernador del pueblo jorreo. Como dándole una respuesta, Siquem se inclinó hacia ella, a fin de conocerla nuevamente como esposo, murmurándole tiernamente al oído:
—Te amo desde el primer momento en que te vi. Pagaré por ti la dote más rica de tu tribu! Hoy mismo hablaré con tu padre y él no me podrá negar su consentimiento.
Dina ya no opuso resistencia y su enamorado violador se dio cuenta, lleno de alegría, de que había ganado la partida. Ahora sólo le hacía falta convencer a los padres de ambos para que les dieran su bendición.
